Janos do multiculturalismo
É evidente que em cenário de crise - que já não é crise, é declínio, empobrecimento que veio para ficar - a questão das minorias étnicas, até há pouco entendida como mero resultado de migrações de força de trabalho, assume a real dimensão de um problema civilizacional. Altercações de bairro, tensões de vizinhança, suspeição e xenofobia sempre existiram. Durante os anos de falsa abundância endividada, pensaram os sociólogos que tudo se reduzia à desigualdade de oportunidades, a diferenças de rendimento e propriedade, bem como a pontuais dificuldades de inserção. Os problemas eram calados com subsídios, as ONG's lucravam com o paternalismo da caridade laica, inventavam-se lugares para gente que não produzia, escolas e programas para os que não queriam estudar, linhas a fundo perdido para dourar a auto-estima daqueles que se pensava queriam entrar na Cidade herdeira do Iluminismo, da revolução da liberdade, da igualdade e da fraternidade. Um magrebino, um paquistanês ou um bangla queriam, cada uma à sua maneira, transformar-se em europeus.
Porém, na década de 90, a Europa descobriu que na agonizante Jugoslávia croatas matavam sérvios, que bósnios eram massacrados por croatas, que albaneses trucidavam sérvios com uma ferocidade tamanha que até o mais escorreito e miserável cardápio do linearismo marxista se mostrava impotente para compreender a profundidade das raízes que levam ao choque. Aquela gente havia morado paredes meias durante séculos - ortodoxos, católicos e muçulmanos viviam nos mesmos bairros e aldeias - a estrutura das diferentes comunidades era similar, sendo também análogas as possibilidades de ascensão social, o reconhecimento e recompensa pelo mérito de cada um. Não fosse a dimensão intangível da religião, da maneira de ver o mundo, da honra e dos deveres que cada um transportava, a Jugoslávia era um modelo eloquente de triunfo de uma ideia artificial de nação acima da ferocidade tribal. Tudo isso ruiu em meses.
Infelizmente, na Europa Ocidental, ninguém quis estudar o tema. Havia, é certo, uma Frente Nacional em França, o discurso "anti-imigração" ia conquistando adeptos, as comunidades migrantes iam-se enquistando em guetos, respondendo aos infantis chamamentos da assimilação com algo que então foi tolamente interpretado como um direito à diferença. Para alindar o problema que se acastelava, inventou-se - nobilitando-o com a chancela da universidade - o multiculturalismo. É evidente que nessa empresa jogou forte o oportunismo da extrema-esquerda anti-democrática em busca de novos nichos eleitorais, como forte jogou o capitalismo do lucro-imediato que reduz a vida social ao mercado. Agora sabe-se que a própria ideia de Europa, confundida com apaziguamento pelo consenso democrático, nada diz a populações que possuem uma hierarquia de valores que não só desprezam (como odeiam) o principio democrático, como contra ele se rebelam em nome de uma verdade inegociável e superior de natureza religiosa. A macabra decapitação londrina, os graves incidentes de ontem na Suécia, a guerra dos minaretes na Suíça, a matança congeminada por Breivik na Noruega, a quase guerra interétnica na Bélgica, na Holanda, na Áustria e em França, a instalação do caos na Grécia, tudo são manifestações claras de algo que vai abrir portas a uma nova era. É tempo, decididamente, dos governantes europeus pensarem, legislarem e agirem para evitar o pior pois, tudo o indica, estamos na iminência de algo de terrível. A Europa, pela estupidez de angelismos, abstrações e agendas para a desestabilização está a caminho de novas formas de hitlerismo.
Há anos, de passagem por Lisboa, fui em romagem ao Mosteiro dos Jerónimos. Era um dia de semana. Para além dos turistas, deparei-me com outra enchente, desta vez miúdos de uma qualquer escola secundária. Eram aos centos. As professoras gritavam, urravam mesmo, para impor autoridade a essa mole de rapazes e raparigas trazidos dos arrabaldes da capital. Verifiquei que as turmas eram, na sua grande maioria, mistas; ou seja, em cada trinta alunos, mais de metade constituídas por gente oriunda das áfricas, das ásias e até de mais longe. Tentei estudar-lhes o semblante. A professora lá ia gritando a aula. O olhar dos alunos era apagado, distante, de olímpica desatenção. Ali falta tudo: a curiosidade, o interesse pela matéria portuguesa, a falta de compreensão pela ideia de Portugal. Saí dali com a clara sensação que a cidadania não se faz. Ou se tem, ou não passa de ficção.
Há anos, de passagem por Lisboa, fui em romagem ao Mosteiro dos Jerónimos. Era um dia de semana. Para além dos turistas, deparei-me com outra enchente, desta vez miúdos de uma qualquer escola secundária. Eram aos centos. As professoras gritavam, urravam mesmo, para impor autoridade a essa mole de rapazes e raparigas trazidos dos arrabaldes da capital. Verifiquei que as turmas eram, na sua grande maioria, mistas; ou seja, em cada trinta alunos, mais de metade constituídas por gente oriunda das áfricas, das ásias e até de mais longe. Tentei estudar-lhes o semblante. A professora lá ia gritando a aula. O olhar dos alunos era apagado, distante, de olímpica desatenção. Ali falta tudo: a curiosidade, o interesse pela matéria portuguesa, a falta de compreensão pela ideia de Portugal. Saí dali com a clara sensação que a cidadania não se faz. Ou se tem, ou não passa de ficção.
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