O futuro do GES
Por Pedro Braz Teixeira
publicado em 2 Jul 2014 - 05:00
publicado em 2 Jul 2014 - 05:00
Os Espírito Santo podem estar a caminho de perder o banco que leva o seu nome
O Grupo Espírito Santo (GES), um dos maiores, e sobretudo dos mais influentes grupos económicos portugueses, parece estar em vias de grandes transformações, que ainda vão no adro.
Está marcada para 31 de Julho a assembleia geral do BES, da qual deverá sair a próxima administração. O BCE já está a fazer pressão sobre o Banco de Portugal para apressar todo este processo, pelo que se espera que naquela data sejam escolhidos administradores já com a aprovação tácita do nosso banco central. Esperemos que nenhum membro da família Espírito Santo tenha assento nesse órgão e que as fantasias de criar um "conselho estratégico" e de nomear um presidente sobre quem impedem suspeitas graves sejam rapidamente postas de lado.
Limpar o BES pode ser a parte mais fácil de todo este processo, enquanto o esclarecimento da situação do GES se deve apresentar como muito mais problemática e com consequências muito mais significativas.
Este grupo está excepcionalmente alavancado e detém um conjunto vastíssimo de activos de forma extremamente indirecta, numa cascata com seis níveis. Os Espírito Santo, no seu conjunto, deverão deter apenas cerca de 6% do capital do BES, se se entrar em conta com essa cascata.
Ao contrário dos Mello e dos Champalimaud, que se separaram de forma relativamente pacífica, os Espírito Santo têm-se mantido unidos nos negócios, apesar de já irem na quarta geração. Esta união dever-se-á, entre outros factores, ao facto de o principal activo do grupo, o banco, ter o nome da família, o que não ocorria nas outras duas famílias. No entanto, esta união pode bem estar a chegar ao seu termo, por duas razões principais.
Em primeiro lugar, porque o nome Espírito Santo, outrora tão prestigiado, passou a ser lepra, no - correcto - entendimento do Banco de Portugal. Em segundo e importantíssimo lugar, porque pertencer ao GES deverá corresponder a uma grave menos-valia.
Falta clarificar todas as contas das diferentes sociedades em que o GES está envolvido, mas há fortes razões para temer que a empresa-mãe do grupo tenha um património mínimo, senão mesmo negativo. Quando isto for devidamente esclarecido, há fortes condições para conduzir ao desmantelamento do grupo. Este rude golpe pode provocar as mais graves rixas familiares.
Há todas as condições para se instalar um ciclo vicioso terrível. Todos estes problemas no GES e BES podem começar a afectar o negócio do BES, agravando as perdas já verificadas nas cotações. Em contrapartida, isso irá gerar problemas adicionais no GES, que gerará mais más notícias, que afectarão de novo o BES, numa espiral negativa sem fim.
É muito provável que o GES venha a ser forçado a vender uma parcela significativa do BES, para fazer face ao elevado endividamento do grupo. Este seria um verdadeiro castigo de Deus. O BES, a par dos outros bancos, é um grande responsável pela acumulação da gigantesca dívida externa portuguesa. Como há muito foi avisado, esta dívida iria forçar o país a perder centros de decisão. É muito provável que o GES seja forçado a vender o melhor do seu património a investidores externos.
A recuperação do GES após as nacionalizações de 1975 foi feita a partir do capital de confiança de que a família gozava. Agora este capital foi altamente danificado por tudo o que já se conhece é bem capaz de ser totalmente destruído pelo que ainda falta saber. Se as perdas forem tão significativas como se teme, será extremamente difícil reerguer a capacidade financeira da família. Assim já não precisarão de brincar aos pobrezinhos...
Deixo para o fim o caso mais intrigante e potencialmente letal: o BES Angola. Segundo o "Expresso", o BES Angola não sabe a quem emprestou 5,7 mil milhões de dólares. Para minha enorme surpresa, esta extraordinária notícia foi praticamente silenciada na imprensa portuguesa e não mereceu um reparo à CMVM nem ao Banco de Portugal.
Há ainda muitíssima coisa a clarificar e muitas contas a liquidar, o que esperamos que seja feito em breve, sob pena de a falta de transparência em todo este processo continuar a afugentar investidores.
Investigador do Nova Finance Center, Nova School of Business and Economics
As opiniões expressas no texto são da exclusiva responsabilidade do autor
Está marcada para 31 de Julho a assembleia geral do BES, da qual deverá sair a próxima administração. O BCE já está a fazer pressão sobre o Banco de Portugal para apressar todo este processo, pelo que se espera que naquela data sejam escolhidos administradores já com a aprovação tácita do nosso banco central. Esperemos que nenhum membro da família Espírito Santo tenha assento nesse órgão e que as fantasias de criar um "conselho estratégico" e de nomear um presidente sobre quem impedem suspeitas graves sejam rapidamente postas de lado.
Limpar o BES pode ser a parte mais fácil de todo este processo, enquanto o esclarecimento da situação do GES se deve apresentar como muito mais problemática e com consequências muito mais significativas.
Este grupo está excepcionalmente alavancado e detém um conjunto vastíssimo de activos de forma extremamente indirecta, numa cascata com seis níveis. Os Espírito Santo, no seu conjunto, deverão deter apenas cerca de 6% do capital do BES, se se entrar em conta com essa cascata.
Ao contrário dos Mello e dos Champalimaud, que se separaram de forma relativamente pacífica, os Espírito Santo têm-se mantido unidos nos negócios, apesar de já irem na quarta geração. Esta união dever-se-á, entre outros factores, ao facto de o principal activo do grupo, o banco, ter o nome da família, o que não ocorria nas outras duas famílias. No entanto, esta união pode bem estar a chegar ao seu termo, por duas razões principais.
Em primeiro lugar, porque o nome Espírito Santo, outrora tão prestigiado, passou a ser lepra, no - correcto - entendimento do Banco de Portugal. Em segundo e importantíssimo lugar, porque pertencer ao GES deverá corresponder a uma grave menos-valia.
Falta clarificar todas as contas das diferentes sociedades em que o GES está envolvido, mas há fortes razões para temer que a empresa-mãe do grupo tenha um património mínimo, senão mesmo negativo. Quando isto for devidamente esclarecido, há fortes condições para conduzir ao desmantelamento do grupo. Este rude golpe pode provocar as mais graves rixas familiares.
Há todas as condições para se instalar um ciclo vicioso terrível. Todos estes problemas no GES e BES podem começar a afectar o negócio do BES, agravando as perdas já verificadas nas cotações. Em contrapartida, isso irá gerar problemas adicionais no GES, que gerará mais más notícias, que afectarão de novo o BES, numa espiral negativa sem fim.
É muito provável que o GES venha a ser forçado a vender uma parcela significativa do BES, para fazer face ao elevado endividamento do grupo. Este seria um verdadeiro castigo de Deus. O BES, a par dos outros bancos, é um grande responsável pela acumulação da gigantesca dívida externa portuguesa. Como há muito foi avisado, esta dívida iria forçar o país a perder centros de decisão. É muito provável que o GES seja forçado a vender o melhor do seu património a investidores externos.
A recuperação do GES após as nacionalizações de 1975 foi feita a partir do capital de confiança de que a família gozava. Agora este capital foi altamente danificado por tudo o que já se conhece é bem capaz de ser totalmente destruído pelo que ainda falta saber. Se as perdas forem tão significativas como se teme, será extremamente difícil reerguer a capacidade financeira da família. Assim já não precisarão de brincar aos pobrezinhos...
Deixo para o fim o caso mais intrigante e potencialmente letal: o BES Angola. Segundo o "Expresso", o BES Angola não sabe a quem emprestou 5,7 mil milhões de dólares. Para minha enorme surpresa, esta extraordinária notícia foi praticamente silenciada na imprensa portuguesa e não mereceu um reparo à CMVM nem ao Banco de Portugal.
Há ainda muitíssima coisa a clarificar e muitas contas a liquidar, o que esperamos que seja feito em breve, sob pena de a falta de transparência em todo este processo continuar a afugentar investidores.
Investigador do Nova Finance Center, Nova School of Business and Economics
As opiniões expressas no texto são da exclusiva responsabilidade do autor
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