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Sunday, September 30, 2007

QUE NUNCA ACABEMOS DROGADOS (2)

TROCA DE BALAS

Para combater o sono induzido pela lengalenga oficial sobre a matéria, vale a pena seguir a (adiada) troca de seringas nas prisões com um livro à mão. O livro chama-se Junk Medicine: Doctors, Lies and the Addiction Bureaucracy. O autor é Theodore Dalrymple, pseudónimo do psiquiatra inglês Anthony Daniels, colunista da revista Spectator e médico (reformado) de uma prisão em Birmingham.

A tese de Dalrymple é simples: a convenção de que o uso de narcóticos é uma doença serve apenas para desresponsabilizar os sujeitos que os consomem e empregar os sujeitos que, alegadamente, tratam o problema. Na longa experiência de Dalrymple, nem o drogado é um doente nem as drogas ditas duras fomentam uma dependência impossível de interromper sem ajuda externa. O "vício" é, acima de tudo, deliberado: é iniciado de livre vontade (ao invés da pneumonia) e pode ser abandonado de livre vontade (ao invés da pneumonia), com desconforto mas longe do tormento físico popularmente difundido. Dalrymple não nega as consequências clínicas do hábito (hepatite, Sida, tuberculose), nega que as consequências façam do hábito uma doença (o montanhismo não é uma doença embora os montanhistas sofram queimaduras do frio). E garante que prevenir os efeitos de um acto deliberado é estimular a repetição do acto. Ou seja: nada de seringas ou injecção "assistida".

Se por milagre o lessem, "Junk Medicine" seria uma fonte de irritação permanente para hordas de médicos, psicólogos, sociólogos, assistentes sociais e funcionários afins. Para mim, foi um prazer, excitante até na discórdia. Para mencionar um pormenor, a ideia (ideia de Dalrymple) de que, em vez de predispor ao crime, a droga é reflexo de uma espécie de "vocação criminosa", logo punível, não me convenceu inteiramente. Não acho que cidadãos maiores e vacinados (aliás frequentemente, e com diversas substâncias) devam ser detidos à conta dos extremos testes a que submetem as entranhas. Porém, é polémico que se gastem fortunas a salvá-los deles próprios. Polémico e ocasionalmente ridículo: no que respeita às seringas nas prisões, o Estado estará, no limite, a fornecer ao heroinómano os meios para que continue a cometer o crime pelo qual foi condenado. Rezo para que o paternalismo não alargue o método aos homicidas.

Terça, 25 de Setembro

ALBERTO GONÇALVES
PSICÓLOGO

QUE NUNCA ACABEM OS DROGADOS!

Empresa nunca foi sujeita a concurso público e foi alargando valências sem pareceres
Quadro do IDT gere associação que domina equipamentos
30.09.2007 - 09h05 Catarina Gomes


Quase todos os equipamentos que dão apoio a toxicodependentes marginalizados na cidade de Lisboa são geridos por uma associação particular, a Ares do Pinhal, cujo presidente é desde há muitos anos um alto-quadro em organismos públicos na área da droga, actualmente no Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT), o psiquiatra Nuno Silva Miguel. As valências e os valores envolvidos foram aumentando sem haver pareceres técnicos nem estudos das necessidades da população toxicodependente na capital.

O último equipamento para toxicodependentes gerido por esta associação, que é financiada sobretudo com verbas do IDT, mas também da Câmara de Lisboa, foi introduzido em 2005. O chamado Gabinete de Apoio Móvel é um consultório que funciona numa carrinha com um médico, um enfermeiro e um monitor.

A valência custa por semestre um máximo de 92.184 euros, 79 por cento das verbas vão para remunerações: 72.684 (números fornecidos pelo IDT para 2006). Contas feitas, cada um dos membros deste staff de três teria que ganhar, em média, por mês 4038 euros. A carrinha trabalha três vezes por semana (uma delas só à tarde).

Quase monopólio

A situação de quase monopólio da associação Ares do Pinhal começou quando decorreu a reconversão do bairro do Casal Ventoso, entre 1996 e 2001. Na altura, foi preciso criar estruturas de apoio para os toxicodependentes que ficaram sem abrigo. Desde 1998 que foi a Ares do Pinhal que tomou a dianteira no apoio.

Com escritórios na aldeia de Eiras (Abrantes), terra-natal do seu fundador, o psiquiatra Luís Patrício, e com comunidades terapêuticas fora de Lisboa desde 1987, a associação teve que fornecer como delegação em Lisboa o consultório deste psiquiatra, que se afastou do projecto há vários anos.

A direcção da Ares do Pinhal passou a ser assumida por Nuno Silva Miguel, que na altura da assinatura do primeiro protocolo era director clínico do Serviço de Prevenção e Tratatamento da Toxicodependência (SPTT) e hoje é assessor de conselho de administração do IDT. Na direcção da associação está também o psiquiatra Rodrigo Coutinho, que chegou a ser subdelegado regional de Lisboa e Vale do Tejo do SPTT e director do Centro de Atendimento a Toxicodependentes de Xabregas (Lisboa), onde hoje é psiquiatra. No site da Federação Portuguesa de Associações de Toxicodependentes surge como um dos números da Ares do Pinhal o telefone do CAT das Taipas.

Escolha temporária

A escolha da associação começou por ser uma solução temporária face à situação de excepção vivida no bairro, gerindo apenas um centro de acolhimento e um gabinete de apoio a toxicodependentes.

Cerca de nove anos depois do primeiro protocolo, a sua intervenção no âmbito do Plano Integrado de Prevenção das Toxicodependências para a cidade de Lisboa mantém-se em quase monopólio. De fora fica apenas um centro de abrigo que é gerido pela associação não governamental Vitae e que recebe poucas verbas do IDT.

A associação tem vindo a ganhar cada vez mais valências sem ter havido estudos de necessidades da população de consumidores problemáticos na capital, cujo número se desconhece. Segundo o que o PÚBLICO apurou, os pareceres técnicos dos serviços, necessários para justificar a existência de novos projectos, não foram dados. Também nunca houve concursos públicos para se saber se outras entidades prestariam estes serviços a preços menores. O ex-director do SPTT e actual presidente do IDT, João Goulão, afirma que o concurso vai ser lançado até ao final deste ano, porque só agora saiu a regulamentação necessária.

O PÚBLICO apurou junto de várias fontes que o departamento financeiro do IDT chegou a chamar à atenção das anteriores administrações para as irregularidades contabilísticas apresentadas pela Ares do Pinhal. A associação chegou a apresentar como despesas facturas de portagens de jipe para o Algarve, máquinas fotográficas e os valores de salários dos seus responsáveis estavam muito acima das tabelas da administração pública. As remunerações eram dadas às mesmas pessoas que acumulavam funções de direcção técnica nas várias estruturas e recebiam múltiplos ordenados.

Nuno Silva Miguel é hoje responsável técnico pelo centro de acolhimento e Gabinete de Apoio Móvel e Rodrigo Coutinho é responsável pelas outras quatro entidades (dois gabinetes de apoio e duas unidades móveis). De acordo com os valores constantes no protocolo de 2006, em média a Ares do Pinhal gasta na rubrica "honorários, remunerações e remunerações adicionais" 75 por cento das verbas atribuídas: até cerca de 1,7 milhões de euros por ano. Em 2005, os valores máximos andavam em torno de 1,5 milhões de euros por ano.

Das duas unidades que começou a gerir em 1998, a Ares do Pinhal tem hoje ao seu cuidado seis: um centro de acolhimento, um gabinete de apoio da zona oriental, outro na zona ocidental, duas carrinhas de distribuição de metadona e o Gabinete de Apoio Móvel. As verbas vêm sobretudo do IDT, que cede gratuitamente a metadona e algum material médico, em parceria com a Câmara de Lisboa, que cede as instalações.

Além dos seis equipamentos, a Ares do Pinhal tentou pôr a funcionar uma terceira carrinha de metadona. O protocolo chegou a ter as verbas atribuídas, mas a carrinha nunca funcionou. De acordo com o director e tesoureiro da Ares do Pinhal, Jorge Silva, o dinheiro nunca entrou nos cofres da associação. Informações fornecidas pelo IDT referem que o valor chegou a ser atribuído, mas foi devolvido.

A verdade é que as verbas constam do anexo financeiro do protocolo do primeiro semestre de 2005, a que o PÚBLICO teve acesso, designado como "reforço da intervenção", com uma verba total de 84.620 euros. No primeiro semestre de 2006 desaparece esta terceira unidade móvel de metadona, mas o Gabinete de Apoio Móvel sobe de custos: passa de 76.820 euros para 92.184.

Nos sucessivos protocolos é prevista uma comissão técnica de avaliação e acompanhamento que nunca saiu do papel, reconhece o actual presidente do IDT, João Goulão